Difícil me é comentar um álbum de jazz, pois escutei pop e rock minha vida inteira. Mas já conhecia o artista pela famosa trilha de "Last tango in Paris". Barbieri é saxofonista argentino e ganhador do Grammy em 72 com a dita trilha-sonora citada acima. Desde a época de sua mudança para a Europa, no começo dos anos 60, o artista confessou que não ouvia e nem entendia o tango... distanciando-se, assim, de suas raízes latinas. Isto mudou no final da década, quando assinou com o selo Flying Dutchman (da ABC Impulse Records) e estreou com esta maravilha de álbum. Apesar de sua fama crescente no velho mundo, o artista experimentou o despertar de um sentimento de resgate - agregando os elementos da música de sua terra natal e, por que não, brasilidades. 4 músicas apenas. Climas, percussão e gritos lancinantes que parecem o de um animal selvagem solto na natureza. É o que me remeteu o som de seu sax tenor com uma banda de apoio mais que afinada - com destaque para o piano de Lonnie Liston Smith. Alguns consideram este um registro único no jazz, com uma sonoridade atonal encima de ritmos latinos. Algo incomum no gênero. A obra foi gravada em dois dias, em 24/25 de novembro do mítico ano de 1969, ano este que marcou a música (Woodstock), comportamentos (como o incidente no circuito de Altamont) e a ida do homem à lua como ponto histórico definitivo.
O lado um, se é que se pode dizer "mais fraco", conta com 2 peças: Introduction/Cancion Del Llamero inicia com um cântico lamurioso de alguma parte da América Latina - um híbrido de canto indígena com cigano e emendando em Tango, com sua harmonia belíssima repetida num crescendo cheio de improvisações alucinantes (destaque para a dupla do baterista Beaver Harris e o percusionista Richard Landrum). Barbieri vai do lamento ao grito histérico com seu sax. Já Zelao é puro exercício de jazz, uma loucura que desata num caos completo. O lado dois diz a que veio. Inspirado no personagem interpretado por Maurício do Valle em "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964) de Glauber Rocha, ele compôs "Antonio das Mortes" (grafado errado na contra-capa como "Antonio das Mortas"). Gato esteve muito próximo de cineastas durante seus anos europeus e sua música pontua isto de forma pungente neste tema - como faria no aclamado filme de Bertolucci 3 anos mais tarde. É possível sentir a dramaticidade na segunda metade da canção, algo angustiante como o sertão em si. "Bachianas brasileiras" passeia pelo tema de Villa Lobos ora aparecendo mais o piano, ora a percussão na exploração da harmonia central sem nunca enjoar o ouvido...
De quebra encontrei um recorte de algum jornal brasileiro datando de 1972 (possivelmente o JB), citando um convite de Barbieri a Gal Costa para que pudesse se juntar a ele num concerto na Europa. Coisas que a gente somente encontra em vinil usado...! Guardei, é claro. Este álbum certamente pelo seu estado é um dos 5 mais difíceis da minha modesta coleção e curti muito ter contato com este jazz louco.
Deixo o link sobre postagem referente a Barbieri no blog: http://jazzerock.blogspot.com.br/search/label/Gato%20Barbieri.
Ano: 1969 / Gravadora: Flying Dutchman / Gênero: Jazz / Formato: gate fold / Estado da capa: 4 / Estado do vinil: 5 / Qualidade do som: 5 / Avaliação: 5 / Origem: E.U.A. / Distribuição: ABC - Impulse Records / Código: FD 10117 CTH.
Ótima resenha. Despertou a curiosidade em ouvir este disco. Então... lá vou eu...
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